BLANK, Renold J. Escatologia da pessoa: vida, morte e
ressurreição. In.:___Na morte a alma
não se separa do corpo. São Paulo: Paulus, pp. 75-113.
O presente texto trás à tona questionamentos
e respostas a um tema não pouco polêmico relacionado à escatologia cristã. O
método tradicional e o mais vigente é posto em cheque quando comparado ao
método antropológico bíblico (em si muito antigo, mas repensado a partir da
década de 70).
A esses dois métodos são postos alguns problemas
até então não resolvidos – ou pelo menos que ainda causam muitos outros
impasses –, a saber: como se dá a ressurreição do corpo? Há separação entre a
alma e o corpo? O purgatório existe? Para tanto far-se-á uma análise do
processo histórico com suas causas e consequências, até chegar aos nossos dias
com a posição atual da Teologia católica que encontra sustentação no Magistério
da Igreja.
1.
Esquema
Antropológico dualista-binário (influência helênica, sem nexo bíblico, fruto do
orfismo – Platão – séc. VII a.C.)
De acordo com o modelo tradicional na
morte, a alma (imortal) se separa do corpo (mortal) e entra numa dimensão nova
ETERNIDADE. Ali, há um Juízo (particular) e conforme o resultado deste juízo a
alma ou entra diretamente no inferno (tormento) ou depois de ter passado certo
‘tempo’ no PURGATÓRIO, entra no céu (felicidade). Desse modo ela ‘aguarda’ a chegada do JUÍZO FINAL (FINAL
DOS TEMPOS - ressurreição do corpo).
A morte nesta perspectiva atinge somente
o corpo, pois para os cristãos a vida continua depois da morte. Enterramos,
portanto, o cadáver, comumente chamado de ‘corpo’, isto é, aquilo que podemos
tocar e ver. Mas como compreender esta verdade, quando se está diante da
verdade inegável do cadáver? A resposta que temos é um recurso a um modelo
antropológico dualista-binário: separação de uma alma (espiritual - essência do homem), que na morte, se separa do corpo (matéria). Tal modelo parece explicar a
fé numa vida após a morte de maneira satisfatória.
Algumas conseqüências, a partir das reflexões
críticas, foram inevitáveis.
a) A
Teologia redescobriu a antiga antropologia bíblica;
b) Efeitos
nefastos e desastrosos em termos de uma espiritualização: desprezo cada vez
maior pelo homem material e concreto e por suas condições de vida histórica. Além
de ter aberto caminho para pensamentos e doutrinas reencarnacionistas.
2.
Esquema
Antropológico bíblico (influência semítica, com embasamento bíblico)
Contrariamente ao pensamento
dual-helenístico, para seus maiores representantes desde Santo Tomás de Aquino,
passando por Jean Vernette e Ernest Haag, além de Karl Rahner, Joseph Ratzinger
(atual Papa Bento XVI) e, sobretudo pelo teólogo alemão Gisbert Greshake, o ser
humano é uma única substância indivisível, onde a alma é a forma do corpo. Como
a substância não pode ser separada ou dividida sem que deixe de ser, tal
pensamento dá ênfase da concepção bíblica do homem.
A Bíblia (Ecle 3,19-20; Mt 10,28 dentre
outros textos) apresenta um modelo não dualista do homem: “o homem é uma
unidade que não pode ser dividida em dois princípios, isto é, corpo e alma.
Consequentemente não é possível que, na morte, uma alma se separe do corpo”
(BLANK, 2000, p. 81).
A alma nunca se separa do corpo, porque
ela forma com ele uma unidade indivisível da pessoa humana única e substancial.
Esta pessoa entra numa dimensão atemporal,
chamada eternidade. Numa dimensão sem tempo não se pode aguardar nada. A alma
não tem tempo de separar do corpo. O ‘momento da morte’ e o ‘momento do Final
dos Tempos’ coincidem na ‘eternidade’ no qual necessariamente acontece a
ressurreição do corpo. A morte não significa uma aniquilação, mas uma profunda
transformação de todo o seu ser. Agente transformador é Deus. Ele mantém e
preserva a identidade total e global daquilo que esta pessoa é, em todas as
suas dimensões, de modo que o homem alcança a sua plena identidade pessoal (cf.
BLANK, 2000, pp. 108-110).
A base desta concepção está na
conscientização de que a alma não
pode ser compreendida em termos de uma substância separada do corpo, mas como princípio
integrativo (de modo que nunca ela
pode ser separada do corpo). O homem é um todo: “contra a tendência
platonizante na Teologia, deve-se compreender o ser humano dentro da
perspectiva da história de Deus com o mundo (uma história que envolve Corpos concretos)” (BLANK, 2000, p. 86).
Conclusão
O modelo tradicional apresenta ainda
outros problemas que devem ser superados: a) leva-nos a questionar se uma alma sem corpo poderia ser plenamente
feliz (=salvação). Dentro do enfoque tradicionalista e dualista,
afirmando-se que a alma, fica mais feliz sem o corpo, porque o seu verdadeiro
ser é o ser espiritual; b) a ideia de
que a alma, sozinha, poderia aguardar na eternidade a ressurreição do corpo
entra em contradição à lógica daquilo que significa ‘Eternidade”. Para
Rahner intervalo – ‘espera’ – entre Juízo final e o particular não poder ser
compreendido com uma continuação do tempo. Para Deus nosso tempo não existe.
Pelo fato de não haver nele sustentação
à fé cristã na ressurreição a rejeição é inevitável.
Apreciação
O autor parece não esclarecer como se
escapa da contradição do ‘cadáver’ ao sustentar a ressurreição do corpo. Todavia,
o modelo bíblico é o que mais e melhor responde os problemas acerca da
escatologia, bem como favorece uma teologia do corpo, assumido por Cristo e por
isso mesmo é bom.
Por: Ir. Thiago Cristino, fmi
Estudante de Teologia
Escatologia moderna - estudo em construção