sábado, 19 de novembro de 2011

Escatologia moderna: na morte a alma não se separa do corpo


BLANK, Renold J. Escatologia da pessoa: vida, morte e ressurreição. In.:___Na morte a alma não se separa do corpo. São Paulo: Paulus, pp. 75-113.

O presente texto trás à tona questionamentos e respostas a um tema não pouco polêmico relacionado à escatologia cristã. O método tradicional e o mais vigente é posto em cheque quando comparado ao método antropológico bíblico (em si muito antigo, mas repensado a partir da década de 70).
A esses dois métodos são postos alguns problemas até então não resolvidos – ou pelo menos que ainda causam muitos outros impasses –, a saber: como se dá a ressurreição do corpo? Há separação entre a alma e o corpo? O purgatório existe? Para tanto far-se-á uma análise do processo histórico com suas causas e consequências, até chegar aos nossos dias com a posição atual da Teologia católica que encontra sustentação no Magistério da Igreja.

1.    Esquema Antropológico dualista-binário (influência helênica, sem nexo bíblico, fruto do orfismo – Platão – séc. VII a.C.)

De acordo com o modelo tradicional na morte, a alma (imortal) se separa do corpo (mortal) e entra numa dimensão nova ETERNIDADE. Ali, há um Juízo (particular) e conforme o resultado deste juízo a alma ou entra diretamente no inferno (tormento) ou depois de ter passado certo ‘tempo’ no PURGATÓRIO, entra no céu (felicidade). Desse modo ela ‘aguarda’ a chegada do JUÍZO FINAL (FINAL DOS TEMPOS - ressurreição do corpo).
A morte nesta perspectiva atinge somente o corpo, pois para os cristãos a vida continua depois da morte. Enterramos, portanto, o cadáver, comumente chamado de ‘corpo’, isto é, aquilo que podemos tocar e ver. Mas como compreender esta verdade, quando se está diante da verdade inegável do cadáver? A resposta que temos é um recurso a um modelo antropológico dualista-binário: separação de uma alma (espiritual - essência do homem), que na morte, se separa do corpo (matéria). Tal modelo parece explicar a fé numa vida após a morte de maneira satisfatória.
Algumas conseqüências, a partir das reflexões críticas, foram inevitáveis.
a)   A Teologia redescobriu a antiga antropologia bíblica;
b)   Efeitos nefastos e desastrosos em termos de uma espiritualização: desprezo cada vez maior pelo homem material e concreto e por suas condições de vida histórica. Além de ter aberto caminho para pensamentos e doutrinas reencarnacionistas.

2.    Esquema Antropológico bíblico (influência semítica, com embasamento bíblico)

Contrariamente ao pensamento dual-helenístico, para seus maiores representantes desde Santo Tomás de Aquino, passando por Jean Vernette e Ernest Haag, além de Karl Rahner, Joseph Ratzinger (atual Papa Bento XVI) e, sobretudo pelo teólogo alemão Gisbert Greshake, o ser humano é uma única substância indivisível, onde a alma é a forma do corpo. Como a substância não pode ser separada ou dividida sem que deixe de ser, tal pensamento dá ênfase da concepção bíblica do homem.
A Bíblia (Ecle 3,19-20; Mt 10,28 dentre outros textos) apresenta um modelo não dualista do homem: “o homem é uma unidade que não pode ser dividida em dois princípios, isto é, corpo e alma. Consequentemente não é possível que, na morte, uma alma se separe do corpo” (BLANK, 2000, p. 81).
A alma nunca se separa do corpo, porque ela forma com ele uma unidade indivisível da pessoa humana única e substancial. Esta pessoa entra numa dimensão atemporal, chamada eternidade. Numa dimensão sem tempo não se pode aguardar nada. A alma não tem tempo de separar do corpo. O ‘momento da morte’ e o ‘momento do Final dos Tempos’ coincidem na ‘eternidade’ no qual necessariamente acontece a ressurreição do corpo. A morte não significa uma aniquilação, mas uma profunda transformação de todo o seu ser. Agente transformador é Deus. Ele mantém e preserva a identidade total e global daquilo que esta pessoa é, em todas as suas dimensões, de modo que o homem alcança a sua plena identidade pessoal (cf. BLANK, 2000, pp. 108-110).
A base desta concepção está na conscientização de que a alma não pode ser compreendida em termos de uma substância separada do corpo, mas como princípio integrativo (de modo que nunca ela pode ser separada do corpo). O homem é um todo: “contra a tendência platonizante na Teologia, deve-se compreender o ser humano dentro da perspectiva da história de Deus com o mundo (uma história que envolve Corpos concretos)” (BLANK, 2000, p. 86).

Conclusão

O modelo tradicional apresenta ainda outros problemas que devem ser superados: a) leva-nos a questionar se uma alma sem corpo poderia ser plenamente feliz (=salvação). Dentro do enfoque tradicionalista e dualista, afirmando-se que a alma, fica mais feliz sem o corpo, porque o seu verdadeiro ser é o ser espiritual; b) a ideia de que a alma, sozinha, poderia aguardar na eternidade a ressurreição do corpo entra em contradição à lógica daquilo que significa ‘Eternidade”. Para Rahner intervalo – ‘espera’ – entre Juízo final e o particular não poder ser compreendido com uma continuação do tempo. Para Deus nosso tempo não existe.
Pelo fato de não haver nele sustentação à fé cristã na ressurreição a rejeição é inevitável.

Apreciação

O autor parece não esclarecer como se escapa da contradição do ‘cadáver’ ao sustentar a ressurreição do corpo. Todavia, o modelo bíblico é o que mais e melhor responde os problemas acerca da escatologia, bem como favorece uma teologia do corpo, assumido por Cristo e por isso mesmo é bom. 

Por: Ir. Thiago Cristino, fmi
Estudante de Teologia
Escatologia moderna - estudo em construção 

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