Trechos de uma relação de Frei José Rodriguez
Carballo, ofm:
Formação para a Vida consagrada no dia de hoje.
... Depois da dimensão espiritual, o
segundo elemento fundamental e inegociável para a formação é a vida fraterna em comunidade. A exigência
é passar da vida em comum à comunhão de
vida, a maneira de vivenciá-la muda de acordo com o carisma, podem ser
secundários os modelos sociológicos de comunidade religiosa, as formas de
organização e os ritmos comunitários, contudo o essencial permanece: uma vida
fraterna em comunidade que mostra ao mundo em que consiste o amor cristão: uma
vida fraterna em comunidade que chega a ser uma verdadeira família unida em Cristo (a
sagrada família do Pavoni), onde
cada um manifesta ao outro o que está precisando e onde todos podem alcançar o
pleno amadurecimento humano, cristão e religioso. A vida fraterna em comunidade
é, de fato, um dos sinais mais fortes do amor do Eterno, mas também o lugar no qual se decide e se torna
mais acreditável a renovação da Vida religiosa. A vida fraterna em comunidade
hoje torna-se um grande valor de testemunho para os homens do nosso tempo
porque apresenta a coisa mais essencial da vida cristã, o
amor fraterno. Encontramos aqui a
essência do anuncio do Evangelho. Para muitos a primeira forma de
evangelização.
É importante, portanto, formarmo-nos
para construir uma vida fraterna em comunidade que seja significativa. Pode-se
acrescentar que a vida fraterna em comunidade é um elemento não somente
essencial na vida religiosa, mas também um dos mais atraentes para muitos
jovens que chegam perto de nós, que na vida fraterna em comunidade procuram um
espaço no qual partilhar e celebrar comunitariamente a fé e a Palavra de Deus; um espaço que coloque ao centro a pessoa,
multiplicando momentos de encontro, e não em primeiro lugar as estruturas; um
espaço vital no qual opera a comunidade de bens e de serviços, como deve ser a
missão partilhada; um espaço no qual é
vivenciada a reconciliação e a correção fraterna e no qual cada irmão acompanhe
o caminho de fidelidade dos outros irmãos; um espaço, portanto, caracterizado
por um estilo de vida simples e aberto à partilha com a gente, em particular
com os mais pobres.
Neste contexto, podemos dizer que uma
fraternidade ou comunidade que deseja definir-se formativa, deve sentir-se
chamada a dar uma resposta ás exigências apresentadas e, ao mesmo tempo, deve
esforçar-se a procurar constantemente os meios adequados para recriar a
comunhão, a intercomunicação, o calor, a transparência e a verdade nas relações
recíprocas de todos os membros. Uma fraternidade ou uma comunidade que quer ser
formativa deve ser também profética,
uma fraternidade-símbolo, que saiba ler os sinais dos tempos e encarnar o
Evangelho de maneira concreta e compreensível para a cultura atual. Uma
fraternidade dedicada à formação deve estar consciente e perceber-se em
permanente formação, procurando junto o que agrada ao Senhor, aceitando-se
reciprocamente, limitando a própria liberdade em função daquela dos outros,
submetendo-se às exigências da vida comunitária e às estruturas indispensáveis
da comunidade. Uma fraternidade formativa deve ser, em definitiva, sacramento
da transcendência e ao mesmo tempo profundamente humana e humanizadora.
Portanto devem ser cultivados valores como a amizade recíproca, a cortesia, o
espírito alegre, tornado-se assim um estímulo permanente de paz e alegria,
colocando sempre Cristo ao centro de tudo.
Algumas
mediações
Como na espiritualidade, também para a
Vida fraterna em comunidade são necessárias mediações
formativas. Entre as principais: a vida ordinária, o trivial: é o cotidiano, a vida dos dias feriais e a normalidade,
o verdadeiro segredo da formação e o que a torna permanente. Fugir de tudo isto seria pueril e procuraria ao religiosos uma
frustração permanente, talvez uma procura eterna de pretextos.
Outra
mediação importantíssima é a dos conflitos.
Pode parecer uma contradição, contudo o
conflito enfrentado com amadurecimento, lucidez e autenticidade pode ser um
importante elemento formativo. Diante dos conflitos, a formação deve ajudar os
jovens e os menos jovens a não ter uma reação de fuga, de acomodação e de competição,
mas uma reação de colaboração. Esta última é aquela que não se subtrai ao
conflito, mas o enfrenta, pagando de pessoa e, ao mesmo tempo, graças à sua
atitude fundamentalmente solidária, respeita posições opostas à própria, sabe
dialogar e colaborar, procurando com honestidade uma solução ao conflito,
colocando em questão as próprias razões. Para aprender a reagir assim será
preciso uma atitude de dialogo como caminho de luz: um ilumina o outro trocando e partilhando pequenos fragmentos de verdade.
Importante, e muito, é, também, a comunicação interpessoal.
É o primeiro passo para progredir na
construção de uma autêntica vida fraterna na comunidade e isto deve acontecer
em três níveis: o que um faz, o que um
pensa e o que um percebe. Portanto, a comunicação é mais do que uma simples
troca de idéias e de notícias. Uma comunicação qualitativamente profunda constitui
um momento de encontro entre pessoas.
Comunicar significa entrar em relação com outro que posso chamar
definitivamente tu. E é no
encontrar-me com o tu que me torno
mais eu.
Para uma comunicação amadurecida, um
aspecto não secundário é a existência de comunidades heterogêneas nas quais a
comunicação não acaba em tornar-se uma armadilha para tentar criar membros semelhantes
entre eles, ou membros que somente se auto-relacionam. Uma casa de formação
deveria refletir, na medida do possível o ambiente familiar tradicional onde
existem idosos, adultos, jovens e crianças. Será necessário conviver e crescer
com o outro, com o diferente desde o começo da vida
consagrada.
Cuidado com uma tentação. Apesar de muitos meios de comunicação disponíveis
entre os religiosos, se tem a impressão que a comunicação interpessoal seja
bastante bloqueada. Encontramos cada vez mais grupos, comunidades, estruturas e
cada vez menos pessoas que se comunicam. Isto pode levar a trágicas
conseqüências em relação á vocação. Será preciso trabalhar na formação à
fraternidade sobre a dimensão da afetividade, como capacidade de relação. É de
uma saudável afetividade que depende em grande parte o ambiente formativo de
uma comunidade.
Para tanto será necessário criar e
favorecer a interdependência, isto é, a
capacidade de trabalhar para um projeto comum e de proceder juntos até alcançar
o mesmo objetivo; caminhar juntos percebendo que é somente aí que encontro
a auto-realização e a felicidade.
Devido a esta interdependência e
colaboração, o grupo desaparece para transformar-se em família, constituído
sim, como já dissemos, de pessoas heterogêneas e com grandes riquezas de papeis.
Famílias nas quais se desenvolvem regras de conduta comuns e se estabelece uma
forma satisfatória de leadership. Neste contexto encontra o seu lugar o Projeto
Comunitário que envolve a vida e a missão. Neste projeto não é tanto a
eficiência operativa que deve ser privilegiada mas a necessidade de uma
integração harmônica do conjunto da nossa vida e estabelecer nele critérios que
orientem a vida e a missão. Entre as prioridades do carisma e da missão, mesmo
durante a formação inicial, deve existir uma dinâmica circular de
retro-alimentação na qual inserir os projetos tanto pessoais como comunitários,
e com uma avaliação que me estimule em
maneira permanente para alcançar sempre mais o que eu desejo ser e desejo
construir junto com os irmãos.
da Testimoni, nº 3.2012