Por Pe. Roberto Remo Cantú,
presbítero pavoniano e arquivista geral da Congregação pavoniana.
Se com certa presunção quiséssemos definir, em uma única palavra o pensamento e a ação educativa de Ludovico Pavoni, talvez esta seria: respeito.
E como se poderia declinar no educador (tanto o Pavoni como o pavoniano) e nos diversos momentos do processo educativo este respeito? eis aqui uma breve relação:
• Simplicidade de espírito
Tudo começa com a maneira simples de nos colocarmos diante do outro; poderíamos dizer até de uma atitude quase ingênua. É importante aquele quase no sentido que esta simplicidade é uma atitude da alma que procura unir os aspectos positivos da instintiva ingenuidade da criança com a ascese psicológica, uma purificação da poluição dos preconceitos.
O Pavoni que tinha um temperamento colérico-sanguineo (cujas componentes fundamentais são a sensibilidade, receptividade ou irritabilidade, e a força, espontaneidade ou reação), se encaminhou na estrada da ascese superando os preconceitos que nascem quando supervalorizamos um único ponto de vista, o dele ou o nosso.
A descoberta do outro, diante do qual nos colocamos à frente, é uma experiência profunda e intuitiva, mesmo se é difícil a ser conceitualizada. E o conseqüente esforço de caminhar em continuação para o outro é uma experiência difícil de vivenciar. Dentro desta dúplice experiência, intuitiva e vivenciada, percebemos que não estamos sozinhos: é a descoberta, o encontro com o nosso Deus.
Não é para uma adequação passiva a valores partilhados na família e no ambiente que o Pavoni na sua vida coloca como fundamento Deus. Não conhecemos o esforço adolescencial, acentuado da provocação em aparência vencedora da modernidade irreligiosa do seu tempo, unida à consciência dos limites da antiga religiosidade, que o jovem Ludovico com certeza vivenciou. Ma ele não se sentiu sozinho neste Êxodo. Deste seu se colocar diante do Outro e do necessário encaminhar-se até Ele, ganhou uma experiência tão intensa que não podia não partilhá-la, em particular, com aqueles que percebia fundamentalmente a ele semelhantes, isto é, os jovens. Escreve um anônimo estimador do Pavoni: para Ludovico Pavoni, o Êxodo inicia assim: um itinerário do qual somente Deus conhece os segredos. Nós podemos somente perceber alguns traços exteriores: desestabilizante novidade de ideais jovens, generosidade maluca, separação e abandono da nativa casa nobiliária, autonomia da família, freqüentação dos pequenos, facilidade de perdão. O Êxodo continuará com um estilo diferente de ser padre, o desinteresse para os cargos, a renúncia ao canonicato, a libertação dos usos e costumes de um típico ambiente devoto, a perda de amizades importantes, até acabar em um poeirento pátio, pai de filhos de ninguém, livre como uma gaivota sobre a imensidade do mar, mas sempre feliz.
O Pavoni tinha, portanto, como temperamento natural uma grande sensibilidade e reatividade. Todo educador, se não tiver alcançado uma semelhante sensibilidade natural e uma imediata reatividade, deveria cultivar com boa vontade a semente que todas as pessoas, pelo fato de ser pessoas, carregam consigo. Por definição, toda pessoa é um ser em relação.
Quanto mais entre o eu e o outro não existir algum diafragma que distorce este se colocar em frente, se o meu olhar interior é e se dirige cada vez, para simplicidade, experimenta-se, inevitavelmente, estupor e também maravilha.
Os outros são o nosso espelho. Nosso porque estamos conscientes de ser os iniciadores deste olhar e, portanto, em certo sentido, os criadores de quem está na nossa frente. O fazemos existir em nós. Nosso também, porque quem estamos enxergando, responde com certeza com um seu próprio modo, mas esta sua resposta é marcada pela nossa presença.
Infelizmente nos poucos escritos do Pavoni e pelo testemunho de quem o conheceu não aparece o estupor positivo, enquanto é salientada a parte negativa, seja em relação a ele mesmo: a minha indignidade me humilha: frio como sou, que deverei esperar ainda? seja em relação aos outros, tão arrogantes e mesquinhos.
Mas também, partindo deste último ponto negativo, podemos deduzir como o seu comportamento interior (psicológico e espiritual) não aceitasse como definitivo o conhecimento da realidade, em particular das pessoas. Os contemporâneos assinalam como unisse à simplicidade sempre uma prudência em relação á complexidade da realidade. Ao contrário do que se poderia pensar, elas, a simplicidade e a prudência, são duas irmãs que devem sempre andar juntas.
O educador pavoniano deve evidenciar em relação a quem se coloca na sua frente uma atitude positiva e aberta, ma em relação a si mesmo envolvido neste caminho educativo, uma atitude prudente
Esta sua atitude interior de simplicidade de espírito e de maravilha sempre atenta para a realidade, em particular, das pessoas, e, nelas, aquela imprevisível dos jovens, não podia que alimentar nele uma atitude de verdadeira humildade.
A verdadeira humildade entendida não como um fechar-se medroso em si, mas uma abertura para uma realidade maior de nós mesmos, nascida da consciência de que nunca conseguiremos entendê-la completamente, de que poderemos cometer erros inevitáveis, que vão além das boas intenções. É este o sofrimento assumido com serenidade por um verdadeiro educador.
O Pavoni foi genial em propor um projeto adaptado às necessidades do seu tempo, à altura dos novos pobres, vítimas de uma nova pobreza em uma nova sociedade, que colocava, em maneira traiçoeira, mas concreta, os mais frágeis e os jovens à margem dela.
Ele nunca julgou que o modelo proposto – o Instituto assistencial-educativo-profissional – resolvesse, mesmo naquele tempo, todas as necessidades individuais e sociais. O seu era um avanço, e na época até de vanguarda, mas soube reconhecer nele, em alguns casos, também, o inevitável caráter inadequado. O modelo por ele proposto com o Instituto de São Barnabé visava uma educação preventiva, na qual o jovem, o adolescente, a criança ainda estava disponível a novas propostas educativas, conseguindo silenciar em si mesmo o chamado da rua e dos possíveis maus exemplos do meio de onde provinha.
Alguém, contudo, não conseguiu. Colocou em perigo, em um contexto familiar baseado no respeito e na liberdade, a necessária partilha de valores.
Os incorrigíveis existiram também em São Barnabé, de alguns até conhecemos o nome. De um, Gaetano Faraoni, conhecemos até a sua história seguinte. O Pavoni foi obrigado a demiti-lo do Instituto, talvez devido a um comportamento moral insustentável . Esta demissão permaneceu como uma ferida no Pavoni. Escrevendo a um seu aluno que tinha encontrado o colega nas ruas da grande Milão, chega, com grande humildade, a assumir uma certa própria responsabilidade (não tenha feito o bastante) pela expulsão do jovem: Não pode imaginar a alegria com a qual li a tua carta. Sempre gostei do jeito do jovem Faraoni e a sua perda me deixou sempre o remorso de não ter feito o bastante para afastá-lo daquelas ocasiões que o fizeram tropeçar. Quisesse Deus que você o possa reencontrar e, quem sabe, com a tua ajuda, endireitar um pouco a sua vida!Fala-lhe que nunca me esqueci dele e que o amo e se o aconselharás a me escrever ficarei bem contente para eu externar-lhe o meu coração.
O educador pavoniano nunca deve perder a confiança em si mesmo ou nas necessárias aquisições das ciências humanas, no caso que perceba que algo ou alguém está fugindo com facilidade até aos mais estudados e aprofundados programas preparados. Isto é inevitável!
As últimas linhas da carta precedente parecem resumir quanto foi dito e antecipar quanto vamos acrescentar sobre a atitude educativa do Pavoni. Não ter feito o bastante para defendê-lo. A simplicidade, a maravilha e a humildade são traduzidas, no agir, mais concretamente, no custodiar este tesouro, no se colocar a serviço de quem o guarda. Não ficam satisfeitas por tudo o que já foi feito, mas se preocupam por o que deverá ser feito a mais. Em uma eventualidade resposta negativa, como é o caso examinado do Gaetano, o pesar não é originado por perceber o próprio limite e incapacidade, mas em perceber o sofrimento do outro.
Dize-lhe que nunca me esqueci dele, que o amo, e, se o aconselharás a me escrever, ficarei contente em poder expressar o meu coração. Carregando consigo o sofrimento do aparente e provisório insucesso educativo em relação ao Gaetano, o Pavoni lembrava, esperava, aguardava. Aguardava somente uma ocasião. Sabemos como o Pavoni na sua atitude exterior, mesmo no meio das suas crianças, mantinha um comportamento reservado, sério, respeitoso, humilde, mas no qual o intuito juvenil sabia perceber não somente a consideração que este nobre, este presbítero tinha em relação a eles, mas algo mais, o afeto e, usando uma palavra bem gasta, o amor.
No epistolário, ao contrário, com uma certa nossa surpresa, o Cônego parece se abrir aos sentimentos mais profundos que florescem no amor.
Os meninos, portanto, estavam enxergando certo.
Quantas vezes, proporcionalmente ao número e ao tipo das suas cartas, ele escreveu a palavra amor ou termos semelhantes!
A primeira carta que temos dele, escrita ao jovem irmão Giovanni entre lágrimas, é uma repetida confissão de amor. E assim aquela acima citada, umas das últimas.
Do respeito ao amor.Hoje, com uma deprecada superficialidade pensa-se partir do amor para alcançar o respeito. É um equivoco bem grande!
Para o Pavoni não podia ser este o caminho correto: do respeito ao amor. Este em uma circularidade virtuosa, alimenta o respeito, a simplicidade, a maravilha, a humildade e o serviço.
Concluindo estas breves considerações sobre o Pavoni, educador, talvez não seja necessário tornar mais manifesta uma presença por si só evidente, mas que, com maior razão de qualquer outra presença, se deixa alcançar e ao mesmo tempo depois passa a fugir, para se deixar novamente alcançar e assim por diante: é a presença de Deus.
No começo desta reflexão, falamos, como dentro da primeira dúplice experiência (intuitiva e vivenciada) do outro se percebe que não estamos sozinhos: é a descoberta de Deus, garante da verdade desta experiência. Não é uma ilusão aquela de descobrir o outro e descobrir que podemos amá-lo.
Sem esta fundamental convicção da presença do Outro, ninguém poderia estar certo de alcançar, conhecer amar o outro.