A bioética é o estudo da moralidade da conduta humana no campo da ciência da vida. É interessante destacar que a Bioética inclui a chamada Ética Médica. A Ética Profissional Médica é, então, um capítulo da Bioética. Isso quer dizer que, para entender, para aprofundar, para refletir sobre a Ética Profissional nós temos que fazer referência à Bioética.
A Bioética não está restrita às Ciências da Saúde. Ela, desde que surgiu, quer olhar para a vida e para tudo, para todas as áreas do conhecimento que, de uma forma ou de outra, tem implicações sobre a vida de todos nós. A sua atuação tem a ver com a vida. Por isso, o verdadeiro enfoque da Bioética é o interdisciplinar, isto é, vista por diferentes óticas profissionais, com diferentes formações, que não necessariamente interajam entre si.
Princípios da Bioética baseados no modelo Personalista
Personalista, por que refere-se a “persona”, pessoa. O ponto de partida é reconhecer a pessoa, reconhecer a identidade da pessoa e sua essência, pois só reconhecendo-a, podemos então saber como respeitá-la. O reconhecimento tem como desdobramento o respeito à dignidade da pessoa humana. Então o ponto de partida é o reconhecimento e o respeito à dignidade da pessoa humana.
Mas o que é dignidade? Essa questão da dignidade parte por uma reflexão filosófica acerca do Ser do homem, numa busca pelo ‘personalismo ontológico’, que é base para o juízo bioético, pois busca entender o ser humano na sua essência, em sua natureza, em sua verdade, em sua totalidade e em sua unidade: “todo homem e o homem todo” (Compêndio da Doutrina Social da Igreja, nn. 65, 121). O ser humano é uma unidade e uma totalidade, por isso a bioética personalista fala em “unitotalidade”.
Não se trata, portanto, de base em um credo religioso específico confessional, dogmático ou piegas, mas de enxergar um caráter do transcendente no imanente, Deus no Homem.
Essa dimensão espiritual da pessoa e do paciente é sempre reconhecida, ou no mínimo intuída na vivência dos corredores dos hospitais. A dimensão espiritual é terapêutica, essencialmente terapêutica.
Porém, a partir de toda essa reflexão que considera o ser humano como uma unitotalidade, quais seriam os princípios que podem ajudar na tomada de decisão na área da bioética?
1. Implica um compromisso existencial e prático em favor de todas as pessoas, em especial, as mais necessitadas - o princípio da defesa da vida física:. Deixar-se interpelar pela pessoa e sua dignidade. Desde o ato mais elementar de reconhecimento da pessoa, a razão prática – e com ela toda a vida concreta do ser humano real (vida física) – se encontra comprometida e obrigada;
2. Implica reconhecer o ser humano como sujeito social – o princípio da sociabilidade e subsidiariedade: Sociabilidade é quando eu reconheço que participo de uma sociedade, que eu compartilho a minha vida com outros e, portanto, eu tenho papéis relativamente aos outros também.E o desdobramento disto é o princípio da subsidiariedade: onde as necessidades forem maiores cabe à estrutura social, à estrutura estatal, apoiar estas iniciativas. Assim, salvar a subjetividade pessoal sacrificando a relação ou defender a relação em detrimento da substancialidade são excessos que é preciso evitar através de um aprofundamento das evidências que oferece a experiência do humano.
3. Implica em construir sua normatividade a partir do imperativo que concebe a pessoa como sendo uma realidade em si mesma – o princípio da liberdade e da responsabilidade. Implica na responsabilidade do profissional de tratar o enfermo, como um fim e jamais como um meio. Implica também na responsabilidade do médico de não aderir a um pedido do paciente considerado pela consciência moral como inaceitável, pois não se tem o direito de dispor da própria integridade física recusando, por exemplo, cuidados indispensáveis à sobrevivência, quando está em jogo a sobrevivência do ser. Isso porque o direito de defesa da vida vem, ontologicamente, antes do direito da liberdade. A pessoa deve ser tratada com um tipo de amor não-instrumental, pois a pessoa é verdadeiramente uma “hypostasis proprietate distincta ad dignitatem pertinente”
4. Implica em partir da diferença entre coisas e pessoas – o princípio terapêutico. Este princípio trata da decisão sobre a terapêutica que vai ser proposta, a terapêutica que se vai implementar no paciente. Segundo esse princípio, é lícito intervir sobre a vida física da pessoa, por exemplo, fazendo cortes e mutilações cirúrgicas. Fala-se do respeito à vida física, mas existem terapêuticas que propõem a mutilização cirúrgica. Então se o princípio da defesa da vida física aparece em primeiro lugar, ele é relativo frente às questões que envolvem a própria sobrevida. A este princípio se liga a norma da proporcionalidade das terapias para avaliar o equilíbrio entre riscos e benefícios. Além do mais a Bioética personalista parte da diferença entre coisas e pessoas. As coisas e as pessoas são realidades de natureza diversa e irredutíveis entre si e requerem aproximações cognitivas diferenciadas. Somente realizando uma “reductio in proprium genus” (uma redução em seu próprio gênero), é possível aprender a respeitar o fenômeno e a pessoa em sua característica específica.
5. Implica em distinguir a irredutibilidade da vida humana a outras formas de vida e a sistemas materiais mais complexos: isto quer dizer que é necessário reargumentar autenticamente sobre a existência da alma humana e seu caráter espiritual. É mister recuperar os pensamentos intelectuais que caracterizaram os grandes pensadores do passado que mostraram a diferença entre alma e corpo, e sua profunda unidade.
Conclusão
A Bioética necessita assumir como princípio a própria pessoa humana, enquanto sujeito que possui dignidade. Uma antropologia normativa desta índole não é patrimônio exclusivo de uma teoria moral, mas da experiência humana fundamental.
Existem momentos em que um eficaz pragmatismo irracionalista faz-se presente não somente nos debates acadêmicos sobre a Bioética, como também na cultura de todos os países, é preciso descobrir os motivos para fazer frente à pura vontade de poder – sem cair uma retórica do medo – preservando autenticamente a dignidade de todas as pessoas, em especial, daquelas que são mais frágeis e estão vulneráveis.
Por: Ir. Thiago Cristino, FMI
Estudante de Telogia
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