Beato Pe. Pavoni, precursor das Escolas Gráficas na Itália. Sua Esperança na juventude pobre o leva a Educar com o coração em vista de uma maior humanização e autonomia. |
Pe. Ludovico Pavoni não escreveu nenhum livro de metodologia pedagógica. A sua vida estava comprometida demais primeiro com a atividade catequética, depois com o trabalho educativo em tempo integral e, no final, no cansativo trabalho de fundar uma nova família religiosa, para ter o tempo e a tranqüilidade para colocar no papel tratados teóricos na área pedagógica, que tivessem um sentido completo e abrangente.
Os poucos escritos que chegaram até nós, colocando de lado os Regulamentos e as Constituições, em gral são cartas, que respondem, na maioria das vezes, a exigências burocrático-administrativas, ou nascida de situações pessoais contingentes.
Apesar disso, a sua ação educativa, ao longo de mais de 35 anos de atividade, a estrutura do seu Instituto de São Barnabé, o testemunho de muitos que o tiveram como educador, as ideias e as orientações pedagógicas que aparecem nos seus escritos, garantem que nele realizou-se a feliz síntese de uma praxe educativa inspirada a uma teoria pedagógica bastante precisa e original.
Ele mesmo tinha uma consciência bem clara de possuir um projeto educativo e não somente uma genérica boa vontade de ajudar crianças e jovens a amadurecer.
A este propósito, escreverá, na dedicatória aos Benfeitores e, depois, na Introdução ao Regulamento do Instituto de São Barnabé, de querer levar ao público conhecimento o Plano de educação sobre o qual fundamenta-se este Instituto (RU I 43); um plano que foi meditado e experimentado através da experiência de vários anos (RU I 43).
Pela clareza das metas educativas, pelas intervenções concretas realizadas, pela valorização da relação interpessoal, educador-educando, pode-se, com todo direito, falar de um método educativo pavoniano[2], que se apresenta com características próprias e originais, e cujo núcleos essenciais merecem ser estudados e retomados também no nosso tempo.
Em maneira quase esquemática, diria didática, podemos apresentar uma espécie de decálogo pedagógico: dez mandamentos sobre os quais, de fato, Ludovico Pavoni construiu a sua ação educativa.
1. Um método educativo flexível e aberto à mudança. Foram escolhidos todos aqueles meios de educação julgados mais oportunos (IG – CP)
Uma primeira característica educativa do pe. Ludovico. está na flexibilidade e na disponibilidade de adequar-se às situações históricas, ambientais, e subjetivas do fenômeno educativo.
A sua própria história pessoal está marcada desta capacidade inovadora, que modifica, com o passar do tempo, as escolhas iniciais e as estruturas educativas realizadas. Do Oratório ao Instituto, da soluções, no começo somente de internato e a tempo integral, à escolha de propostas educativas parciais como Escolas de Ensino Fundamental e Médio para os mais pobrezinhos m regime de externato (CP 126-128) e escolas profissionais também aos jovens em regime de externato[3]. Quando acontecimentos contingentes tornaram necessárias novas aberturas, a sua sensibilidade educativa o fez atento a novas formas de carência e de pobreza (os atingido pelo morbo da cólera, os surdos, os filhos de famílias empobrecidas).
Em 1831,publicando o Regulamento do Instituto de São Barnabé, Ludovico Pavoni na introdução para os seus colaboradores reafirmará que o texto foi reorganizado na base das experiências de vários anos (RU I 43). Também no começo das Constituições, que foram terminadas no dezembro de 1845, na Idéia Geral que introduzia o texto[4], escreve que para o bem dos jovens devem ser escolhidos todos aqueles meios de educação julgados mais oportunos e que venham a responder às circunstância de tempo e de lugar. Exemplificando, sugerirá aos seus Religiosos que será conveniente preparar os meninos profissionalmente se tais Instituições se encontram na cidade, ou no cultivo da lavoura, quando estão nas vilas do interior (CP 122).
2.Um método que fala à razão e ao coração. O chicote do homem deve ser a razão (carta a LG 29).
Como relevante novidade em relação ao seu tempo, pe. Ludovico rejeita toda forma de método coercivo e qualquer justificativa para a punição física. Sobre isto o seu pensamento é claro e explícito. Ao jovem colaborador Domingos Guccini, que freqüentava o Curso de especialização para professores de surdos na Escola Estatal Girolamo Cardano de Milão, onde as punições corporais e o uso do chicote eram rotina, pe. Ludovico aos 30 de janeiro de 1846 escreve: Saiba se conter com aquela gravidade que ganha respeito, mas juntamente com aquela doçura que atrai, arrebata. Deixa a quem queira o chicote, porque o chicote do homem deve ser a razão. Já antes, no capítulo sobre o método de correção no Regulamento do Instituto de São Barnabé, ao nº 58, afirmava: Em lugar de apelar para o sistema da severidade, com o qual, na maioria das vezes, levamos os meninos a agir mais por temor e por hipocrisia do que por sentimento e amor, escolhemos o recurso à emulação e da dignidade e honradez, através do qual tudo é possível no coração sensível da juventude (RU I 54).
A relação com o aluno, portanto, se expressa com um comportamento não repressivo, mas persuasivo, inspirado ao raciocínio e ao diálogo, através o colóquio freqüente e pessoal, paternas advertências a fim de que os meninos reflitam...e se corrigiam, (RU I 55).
Conceitos semelhantes se encontram no Regulamento do Oratório, onde lembra-se aos educadores de aproximar-se e de guiar os meninos com sábios conselhos, com modos agradáveis e corteses (RU I 21). Mais adiante afirma que deverão corrigir os defeitos deles com afabilidade (RU I 23). Assim também fala que o responsável do Oratório, devendo sensatamente repreender com indulgência algum dos jovens por algum defeito, procurará fazê-lo com jeito afável e suave (RU I 19).
O método educativo pavoniano de verdade enfoca o homem nos seus aspectos mais qualificantes da pessoa, isto é, a razão e o coração.
3. Um método que se fundamenta na colaboração. Completamente de acordo sobre o método de educação (RU I 43).
O termo colaboração nunca aparece nos escritos de Ludovico Pavoni. Mas é toda a sua praxe educativa que afirma com clareza a convicção de que a educação é trabalho de equipe, fundamentado sobre uma coerência na postura, sobre homogeneidade de intenções, sobre a coordenação das intervenções. Na medida que a criança evolui, cada vez mais aparecem novas figuras que adquirem relevância educativa e, portanto, torna-se necessária uma estratégia de conjunto, uma instância unificadora, mesmo no pluralismo dos modelos e dos papéis.
Por isso mesmo pe. Ludovico quis, nas suas estruturas de serviço, em relação às crianças e aos adolescentes, tanto no Oratório como no Instituto, os dois Regulamentos, que antecipam de certo modo a exigência atual dos projetos educativos, porque – escrevia na Introdução do Regulamento de São Barnabé - mesmo se tivéssemos todos o mesmo sentimento, não poderíamos alcançar resultados na tarefa sem sermos concordes no método educativo (RU I 43).
Nas suas Instituições educativas trabalham juntos religiosos e leigos, professores e artesãos, instrutores na área profissional e educadores- regentes de turma, em uma rica articulação de papeis diferentes, mas unificados com um único método comum, coordenados em uma estrutura hierarquizada que diz relação à autoridade paterna do Diretor ou do Superior. Este ocupa-se, com paterno cristão cuidado, da direção da juventude; dele dependem todos os funcionários (RU I 44).
O Regulamento do Oratório descreve também um organismo de Consulta, com a presença dos principais operadores, que se reúnem periodicamente com o Diretor para enfrentar tanto os problemas espirituais como os econômicos... a observância das Regras e o bom andamento, a manutenção devido a algum estrago, etc. Neste organismo as decisões são tomadas democraticamente com escrutínio segredo, dando um peso maior – 3 votos - ao parecer do Diretor (RU I 18).
- Puerocentrismo ou atenção à pessoa. Um tesouro precioso e santo (CP 257)
No método educativo pavoniano a primeira preocupação do educador é aquela de estudar a personalidade de cada criança, para chegar a um conhecimento e a uma relação interpessoal profunda. Descobrir os traços do caráter, as qualidades intelectuais, os dinamismos emotivos, as experiências e a vivência pregressa, a ação misteriosa da Providência e da Graça de Deus, para depois potenciar o que é positivo e corrigir o que está errado. Mesmo na estrutura muito organizada das suas instituições educativas, pe. Ludovico coloca sempre no centro a pessoa da criança, na sua irrepetível unicidade e na sua inconfundível originalidade. O método educativo deve, portanto, individualizar-se, até tornar-se projeto focado sobre as exigências da criança. Os professores e os instrutores dos cursos profissionalizantes estudem com atenção o temperamento e as aptidões dos seus discípulos, para conduzi-los conforme suas inclinações, pois nem todos querem ser guiados do mesmo modo. Não pretendam, obter de todos igualmente, ms conforme as capacidades e os dons que receberam de Deus. (CP 259). Por parte dos educadores deverá existir, em relação às crianças, grande atenção à sua condição e às suas capacidades e inclinações (CP 124). O Mestre dos Noviços - mas a indicação vale para qualquer animador religioso - deverá estudar o modo com que a Graça de Deus tende a santificar a cada um e saber favorecê-la (CP 272).
Ludovico Pavoni recomenda ao Diretor do Instituto de prestar uma particular atenção nas atividades de recreio e lazer, observando as crianças e os adolescentes durante os jogos para facilmente descobrir o caráter e as inclinações de cada um e poderá encontrar o método mais adequado para orientá-lo com êxito (CP 242). E, alguma linha mais adiante, convida ainda o Diretor a ter, em particular, frequêntes e oportunas conversas[5] com os meninos para escutá-los, corrigi-los, aconselhá-los. Para todos vale a exortação de entrar na alma dos alunos novatos,..descobrir o caráter, apreciar as boas disposições, remover os humanos defeitos (RU I 21). Deste conhecimento personalizado é que brota o respeito, a estima, a admiração para cada pessoa, mesmo se ainda não desenvolvida e problemática.
O educador pavoniano deve saber olhar os próprios alunos com o olhar de Deus, cheio de confiança e de esperança. Reconheça-se que sobre eles há um projeto especial da Divina Providência e, alimentado a seu respeito as melhores esperanças[6], use-se para com eles de toda a tenção para facilitar-lhes o cumprimento dos desígnios divinos. (CP 125). Na ótica educativa pavoniana cada criança, qualquer uma delas é sempre um tesouro preciosos e santo (CP 257)
- O espírito de família nota dominante do método pavoniano. Amando-os como a pupila dos próprios olhos (CP 257).
O valor e a eficácia de um método educativo são revelado em primeiro lugar pelas relações que se estabelecem entre educador e criança, pelo clima humano que se determina no ambiente onde interagem educadores e meninos, numa palavra pela espontaneidade e pela cordialidade que permeiam toda a complexa trama que se criam em uma convivência. A característica dominante do método educativo do pe. Ludovico é sem dúvida alguma, a irradiação e a profunda atitude de amor, inspirado ao modelo familiar. Atitude que qualifica a instituição pavoniana e que por tradição é chamado espírito de família.
Para pe. Pavoni, família deve ser tanto a comunidade dos meninos, como aquela dos colaboradores na obra educativa, compreendendo nela os leigos, que permanecem leigos e os futuros religiosos. Na alocução que faz de prefácio às Regras Fundamentais (ano de 1830)[7], o Instituto são Barnabé no seu todo, crianças, adolescentes, jovens e educadores é chamado de numerosa família (RU I 62) e a esperança do pe. Ludovico é que alguns daqueles que com ele têm trabalhado para criar aquela família possa, em seguida, fazer parte da sagrada família (RU I 62). Ainda sagrada família é chamado o núcleo dos colaboradores que em 1831 com eles estão comprometidos no Instituto e que desejam permanecer nele para sempre (RU I 42).
Nas Constituições (1845) a expressão Religiosa família torna-se sinônimo corriqueiro de Congregação e de Instituto (IG, CP 1.43.56, etc,). E aos nn. 75-76 é esboçado em maneira incisiva este clima familiar e fraterno, feito de santo afeto, de paz, caridade e amabilidade,...em espírito de fraternal caridade que leve a constituir de verdade uma Religiosa família. Desde muito tempo antes, no Regulamento do Oratório, escrito e re-escrito entre o 1815 e o 1818, o desconhecido autor do Prefácio havia respirado, no grande grupo dos oratorianos, este clima familiar, por isso concluía o seu escrito descrevendo o Diretor pe. Ludovico Pavoni como Padre a ser venerado e amado (RU I 11).
E família devia ser o Instituto São Barnabé para as crianças e os jovens que eram aí hospedados. É significativo que um dos alunos do Pavoni, tornado em 1850 seu segundo sucessor como Superior da recém nascida Congregação, pe. Giuseppe Baldini, escrevendo as memórias, nos deixasse este esplendido testemunho: A verdadeira idéia , a idéia característica do Instituto Pavoni é esta: que os filhos pobres, abandonados por seus pais e parentes mais próximos, aí encontrassem tudo o que perderam. É necessário ponderar bem isto: não se trata de encontrar no Instituto o alimento, a roupa, a escolaridade e a aprendizagem dos ofícios, mas o pai e a mãe, a família de quem a desventura os privou; e com o pai e a mãe, a família, tudo que um pobre poderia ali receber e desfrutar (LPV 632 r).
Os escritos pavonianos transbordam de acenos discretos mas significativos, acerca da qualidade familiar das relações educativas dentro do Instituto. O Superior deve dirigir a juventude com paterno cuidado cristão (RU I 44). O animador religioso deve ser um verdadeiro Pai (RU I 45). Em relação aos jovens a eles confiados, os instrutores das Oficinas e Laboratórios deve acompanhá-los com amor e carinho (RU I 45). Os educadores devem corrigir com benevolência as faltas deles (RU I 46). Nas Constituições está escrito que o animador religioso procurará tornar-se santamente benquisto (CP 251). Os instrutores dos laboratórios e das oficinas velarão sobre os alunos que lhes forem confiados,... amando-os como a pupila dos próprios olhos. (CO 257). Para o Diretor, os alunos devem ser filhos[8] e nunca há de deixá-los sem a sua assistência (CP 242).
Também a vigilância dos alunos recomendada ao Diretor (CP 242) e aos instrutores (CP 260) nunca os deixarão sozinhos, deve ser vista como sinal de cuidado e de afetuoso interesse próprio de quem, como em uma família, coloca tudo em comum e tudo partilha. Presentes sempre entre os alunos para rezar, trabalhar, comer[9], brincar com eles e assim precedê-los com o próprio exemplo. A primeira lição e a mais eficaz para...educar dentro de uma visão cristã a juventude... é aquela do bom exemplo (RU I 46). Esta assídua presença educativa dará aos educadores o doce agrado de ver crescer ao lado deles esta família numerosa de filhos bem educados que agradecidos pelas paternas atenções não deixarão nunca de agradecer a vossa caridade (RU I 43)
O epistolário todo do pe. Ludovico Pavoni está cheio de expressões ricas de sentimentos carinhosos, de atenções e de dedicação afetuosa[10]. Assim também os Processos para a Beatificação trazem muitíssimos testemunhos de ex-alunos que, a dezenas de anos de distancia,lembravam muitos dos seus gestos de atenção e o seu afetuoso carinho para com eles[11].
E, como em toda família feliz, o afeto é sempre acompanhado pelo respeito à dignidade pessoal de cada um, mesmo se de menor idade e inexperiente. Aqui vão alguns acenos presentes nas Constituições. Os instrutores das oficinas tratarão os seus alunos com brandura e cortesia (CP 260); respeitem os alunos se quiserem ser respeitados (CP 236). Usarão sempre de trato cortês e respeitoso; ninguém desprezem com palavras e gestos (CP 257).
A mesma delicada tarefa da orientação vocacional, que é o momento fundamental de toda a educação moral e religiosa, deve ser efetuada com grande discrição, no respeito à iniciativa divina e à liberdade do homem. É só ler o CP nº 253, no qual pe. Ludovico recomenda aos animadores religiosos a prudência e o garbo necessários para iluminar e para aconselhar adolescentes e jovens nas próprias escolhas vocacionais[12].
6. A fé cristã alma de toda a ação educativa.Tudo que não é Deus nada vale (CP 252).
A ação educativa toda do pe. Ludovico é pouco compreensível, se a separamos da uma visão profundamente cristã do homem, do seu destino, do sentido religioso da vida. Ele enxerga, de fato, na religiosidade o objetivo fundamental de toda boa educação (CP 244). Da sua rica experiência de fé derivam seus princípios educativos.
Em primeiro lugar a formação moral e cristã inicia com a instrução religiosa. Nas estruturas educativas pavonianas ter-se-á um cuidado especial na formação do coração dos jovens, na instrução religiosa e nas práticas religiosas (CP 123). Nasce daqui a exigência de uma oportuna catequese e de uma gradual aproximação à Bíblia[13].
Ao lado da instrução religiosa, contemporaneamente, deve proceder a formação de uma consciência cristã e de uma mentalidade de fé. O animador religioso cuidará que as crianças e os jovens cheguem a descobrir que tudo que não é Deus nada vale...a considerar as coisas com os olhos da fé, julgando-as como as julga a fé (CP 252).
A instrução e a formação ético-religiosa devem depois ser traduzidos na atuação concreta de gestos de fé e de comportamentos morais, levando a fazê-los saborear os princípios da fé que professam (CP 244), até fazê-los descobrir a utilidade de um conselheiro espiritual que os acompanhe na própria vida cristã.
Pe. Ludovico, como todo bom cristão, alimenta na sua espiritualidade uma intensa devoção à humanidade de Cristo e à figura materna de Maria Imaculada (CP 101.103), e apresenta aos seus religiosos e meninos esta religiosidade cristocêntrica e mariana, mas sem nenhum sentimentalismo. No seu Instituto vai ser cultivada uma piedade sólida, robusta, desinibida e esclarecida, que vise à perfeita observância dos próprios deveres (CP 123)[14].
Com certeza no contexto atual de difusa ignorância religiosa e de progressiva descristianização pode maravilhar e até enfastiar, a leitura do programa das atividades religiosas propostas pelo Padre no domingo aos que frequentam o Oratório[15] e em cada dia aos alunos do Instituto São Barnabé[16]. Esta multiplicidade de ações litúrgicas e esta abundância de oração e de catequese torna-se contudo mais compreensível se considera-se a centralidade da proposta e da formação do Projeto educativo do pe. Ludovico Pavoni[17].
- A atividade escolástico-profissional como elemento educativo. Esforçar-se-ão por acostumar os alunos a amar o trabalho (CP 258).
Ludovico Pavoni, precedendo a moderna ergoterapia, é consciente que uma atividade de acordo com os anseios e as aptidões do sujeito pode tornar-se um estímulo eficaz de amadurecimento e de crescimento da pessoa, que ao encontrar no trabalho gratificações saudáveis e profundas, além de um meio de subsistência, será reforçado,no seu processo educativo. A profissão torna-se assim um meio de formação do homem e do cristão[18]. Escreve, neste sentido, o pe. Ludovico nas suas Constituições : O objetivo primordial que os mestres de artes e de ofícios devem propor-se não deve ser habilitar os alunos no ofício escolhido, mas de formá-los para que amem a religião e a prática das virtudes morais.
No Instituto de São Barnabé, pelo menos no domingo de manhã, existe um tempo dedicado à atividade escolar Não conhecemos a sua programação, sabemos, contudo, que deviam estar presentes aulas de noções elementares de tecnologia, de merceologia, de desenho, de língua, de cálculo matemático. Os professores eram escolhidos com cuidado e eram até muito estimados entre os docentes da cidade (RU I 50-51).
Os dias de trabalho transcorrem nos laboratórios e nas oficinas, de acordo com o tirocínio prático de tipo artesanal. Os jovens tornavam-se assim não somente operários genéricos, mas mestres artesãos.
Pe. Ludovico Pavoni cuidava também dos problemas da Orientação Profissional: respeitava as aspirações e as aptidões de cada menino, sem obrigá-los em maneira condicionante à estrutura de produção do Instituto. Escreve, a este propósito nas Constituições: Quanto ao esforço para tornar esses jovens capazes e habilidosos para prover, a si mesmos com o seu próprio trabalho, e preparar-se a viver honestamente pelo mundo afora, grande atenção se deverá prestar à sua condição e às suas capacidades e inclinações, para que eles possam escolher aquela profissão para a qual se sentem mais inclinados e desenvolver mais plenamente suas aptidões, facilitando, assim, a consecução de resultados positivos (CP 124).
Daqui nasce a preocupação de ampliar o número de laboratórios[19], aos quais será, em seguida, acrescentado, preocupado em particular para com os surdos, a fazenda de Saiano.
Também na atividade escolástico-profissional a relação instrutor-aluno fundamenta-se num acompanhamento permanente – nunca os deixarão sozinhos (CP 260) - amoroso – amando-os com a pupila dos próprios olhos (CP 257) – respeitoso – trato cortês e respeitoso (CP 257), mas também firme e com autoridade – não exijam demais, porém não se mostrem fracos (CP 258).
Apesar de se desenvolver, nas oficinas de São Barnabé, também uma intensa atividade de produção, dominava, primário neles, a atitude de respeito à dignidade do aluno e a preocupação para sua formação e para a sua aprendizagem, bem mais que a atenção a um interesse econômico. Esclarecedor, neste ponto, a relação do pe. Pavoni com pe. Alemanno Barchi[20].
Na estrutura educativa pavoniana percebemos, também, a valorização da cultura, entendida não somente como elemento integrativo do trabalho, mas como meio de promoção da pessoa.
Os alunos melhores são convidados a se especializar na própria profissão até em outras cidades. O nº 18 do regulamento do Pio Instituto prevê a oferta gratuita aos melhores alunos de continuar os estudos em nível superior (RU I 58).
Pe. Pavoni é também atento às exigências do mercado de trabalho. Por isso mesmo recomenda atenção na escolha dos laboratórios e preocupa-se para ajudar os alunos a entrar no mercado de trabalho (CP 122)[21]
- Ordem, disciplina, sacrifício. Com eles é necessário alternar brandura e energia (CP 274).
Mesmo em um contexto de clima familiar amigável, o método educativo pavoniano, dá muita atenção ao sacrifício e à disciplina, não como finalidades em si mesmas, mas como elementos importantes de educação ao equilíbrio, ao autocontrole, ao domínio de si mesmo e das próprias pulsões. Hoje, falaríamos da necessidade de coordenar e de integrar todas as energias vitais da pessoa sob o controle daquela instancia agregadora que é o EU.
Neste sentido o educador alternará com os alunos brandura e energias (CP 242). Veja tudo, dissimule e corrija com prudência e castigue pouco,...mas que os castigos, quando necessários, sejam salutares e eficazes (CP 242). Muita cautela e paciência seja parco em castigar os defeitos provenientes da vivacidade natural dos rapazes e da sua leviandade e superficialidade...mas seja, pelo contrário, inexorável em reprimir as faltas que derivam da má vontade e estimuladas pela teimosia (CP 242).
Os instrutores dos laboratórios - mas a indicação é válida para todo educador - não cederão nunca às suas pretensões quando forem injustas, nem deixarão que satisfaçam sua teimosia. Não exijam demais, porém não se mostrem fracos (CP 258).
Mesmo as muitas normas escritas no regulamento do Pio Instituto (RU I 51-57), visam, afinal de contas, à realização deste tipo de personalidade bem integrada e harmonicamente desenvolvida. O Pavoni desejaria fazer dos seus jovens homens, operários, sim, mas cavalheiros.
- Clima de alegria e jovial atividade como notas características do Instituto.
Honestos e sinceros, joviais e alegres, animados e ativos (CP 270).
O clima de serenidade e de alegria que o pe. Ludovico queria no seu Instituto deriva antes de tudo de um estilo nas relações interpessoais, marcado pela cordialidade, alegria, dinamismo. Neste sentido devem ser formados tanto os Pavonianos como os educadores. Nas Constituições ele solicita o Superior local a trabalhar para que os Religiosos sejam de ânimo alegre, jovial, não permitindo tristezas ou melancolias, por demais contrárias ao espírito do Instituto (CP 215). Na entrada dos jovens na vida pavoniana, o responsável deverá avaliar não somente as qualidades morais e as motivações religiosas, mas também o caráter deles, de temperamento dócil, sincero, alegre,... de constituição física sadia,..de boa aparência (CP 23). O formador deverá educar os noviços a serem honestos e sinceros, joviais e alegres, animados e ativo, porque essa nossa Congregação precisa de pessoas desenvoltas e operosas e não de devotos acanhados e misantropos (CP 270).
Na carta do 11 de setembro de 1845 que escreve ao Domingos Guccini, pe. Ludovico expressa apreço pela sua natureza sociável e simpática e assim devem ser os irmãos da nossa Congregação, pois os deveres de nosso ministério o exigem no trabalho educativo. Assim, também, em uma outra carta de 19 de 03 de janeiro de 1847 ao seu jovem aluno e futuro professor dos surdos, o surdo Antônio Renoldi, o Pavoni escreve: Se você se manterá sempre bom e alegre será agradável ao Senhor e também aos teus Superiores e gozaras de muita paz (RU III 165). Ao responsável da atividade educativa, pe. Pavoni recomenda de valorizar os momentos de lazer e de recreio vivenciados com uma certa liberdade, mas da serem utilizados também como momentos formativos. Na brincadeira, no esporte revela-se melhor a natureza e o temperamento do menino e através o compromisso da diversão podem ser educadas suas tendências (CP 242). Eram muitas as iniciativas de lazer e de divertimento atuadas no Instituto São Barnabé, entre elas: excursões com almoço nos campos, caçar aves com arapuca e armadilhas, noite de cantos e fogos de artifícios, atividades dramáticas, o coral tanto litúrgico como recreativo, o carnaval, as semanas de passeio-prémio com o Diretor para os melhores alunos[22].
- A lei da gradualidade. Dos principiantes não pretenda demais (CP 271)
Como bom conhecedor de crianças e jovens, pe. Ludovico sabe muito bem quanto são grandes as diferenças caracterologicas que existem entre menino e menino e relevantes as transformações que acontecem ao longo da idade evolutiva, entre a pré-adolescência, a adolescência e a juventude.
Natural, portanto, a lei da gradualidade na formação. As propostas e as exigências educativas devem ser efetivamente medidas em função do nível de amadurecimento e das reais possibilidades de cada um, de maneira que a intervenção educativa seja personalizada ao máximo.
Instrutores e educadores estudem com atenção o temperamento e as aptidões dos seus discípulos, para conduzi-los conforme suas inclinações, pois nem todos querem ser guiados do mesmo modo. Não pretendam obter de todos igualmente, mas conforme as capacidades e os dons que receberam de Deus (CP 259). Falando do Mestre de Noviços escrevia: de todos exigirá a boa vontade e dos principiantes, em modo particular, não pretenda demais. Destes não se deve esperar a prudência e a maturidade dos mais adiantados, que já adquiriram o hábito das virtudes (CP 271).
Pe. Pavoni nos deixa um testamento educativo que vale a pena ter presente, permitindo às suas intuições permanecer vivas. Por nosso meio, elas continuarão a fluir como sabedoria educativa para os meninos que vão viver neste terceiro milênio.
[1] Veja Aurelio Gallina: Il metodo educativo di Lodovico Pavoni, em Aa Vv, Loovico Pavoni um fondatore e la sua cittá , Congregazione FMI Pavoniani – 2000 – pagg145-157
[2] Veja: Giuliano Bertoldi, A experiência apostólica de Ludovico Pavoni Congregação dos FMI , 2003, Cap. XIII, págg.144-179
[3] Regolamento del Pio Istituto,nº 65, em RU I 56
[4] É uma importante introdução histórico-carismática, na qual o Pavoni manifesta o seu projeto e a sua experiência de Fundador.. Veja: Giuseppe Rossi,fmi,l’Idea generale nelle CP, em BI,199, págg.194-222
[5] A grande arma do educador é o encontro pessoal, face a face. O educador não pode somente usar os métodos estruturais, as técnicas de grupo a gestão da atividade, mas deve chegar a este encontro com a criança, o adolescente, o jovem..
[6] É esta esperança que sustenta o otimismo do educador. Justamente com aquelas crianças com um passado de experiências muito doloridas, age uma particular Providência de Deus. Cada um deles é portador de um futuro;. Depende do educador descobri-lo, juntamente com ele, e cultivá-lo até que chegue à realização do divino desígnio
[7] Corresponde , praticamente, a um primeiro esboço, essencial e incompleto das Constituições.
[8] Muito bonito o testemunho que encontramos no Necrológio publicado no Calendário Diocesano de Bréscia de 1850: Pueros quos a Deo quase filhos acceperat = Tinha recebido de Deus os seus meninos como se fossem filhos (LPV 898r)
[9] O I.R.D. Carlo Breinl ficara maravilhado quando viu pe. Ludovico comer com os alunos e o 02 de abril de 1843, escrevendo ao Vice-rei, colocará em evidência este particular que o tinha surpreendido: Para um filantropo é comovedor ver o Cônego Pavoni sentar e partilhar a simples comida com os seus alunos (ASM, Araldica, PM,b.230 – Corona Férrea)
[10] Ver , em particular as cartas a Domingos Guccini
[11] Veja LPV, Índice Analítico, às palavras: Paternitá,Cuore,Tenerezza, etc.
[12] Veja, também, na carta ao Pedro Amus com que discrição o Pavoni o aconselhe na escolha do seu estado de vida (Lettere del Servo di Dio, pág.10)
[14] Lembre-se o fato do coroinha devoto demais, contado na biografia do Pavoni do Traverso, pág.65
[15] Regolamento dell’Oratorio, Capp. III e IV, RU I 13-14
[16] Regolamento Del Pio Istituto, nnº 24-33, RU I 50-51
[17] Hoje,também, esta proposta deve permanecer um ponto qualificante na programação das Instituições educativas pavonianas. É altamente desafiador conciliar a exigência de professar a nossa fé e a acolhida de usuários cujas famílias professam outros credos, ou simplesmente são arreligiosos. Interessante lembrar o papa João Paulo II quando em Assis convidava pessoas de todos os credos não a rezar juntos, mas a juntos rezarem.
[18] Este assunto está desenvolvido com uma ampla documentação em R.Cantú, fmi, Le Scuole delle arti di Lodovico Pavoni e l’Istruzione professionale a Brescia, em Aa.Vv. Lodovico Pavoni um fondatore e la sua cittá. Do mesmo autor pode ser visto: Lodovico Pavoni e l’istruzione professionale a Brescia negli anni della Restaurazione, em R.Sani (curador), Chiesa educazione e socitá nella Lombardia del primo Ottocento – Milano – Centro Ambrosiano – 1996, págg. 283-328. Este estudo encontra-se também no Anexi de Aa.Vv. Lodovico Pavoni un fondatore e la sua citta.
[19] Veja a relação dos existentes em 1831 em RU I 57-58
[20] Veja carta em RU II 127. Esta relação do Pavoni com o Barchi é amplamente documentado no estudo, já citado, do R. Cantú.
[21] Veja Regolamento del Pio Istituto, nº 16, em RU I 48
[22] Veja a carta ao Guccini nº 06, e a carta nº 10 que descrevem momentos de férias, como também o nº 62 do Regolamento del Pio Istituto em RU I 55
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